Bus 142

Destination Nowhere

Paso de Los Toros a Florida

Com medo de ter de enfrentar tanto vento contra quanto no dia anterior, e ainda mais em um dia de percurso mais longo (150 km), fui deitar pensando em sair da cidade um pouco antes dos primeiros sinais de clarear o dia. Coloquei o despertador para 4h30. Com isso, pensei, deixo pra lá o café da manhã e chego em Durazno em torno das 8h, 8h30. Porém em minha cabeça eu estava calculando que seriam em torno de 50km, o que daria cerca de duas horas e meia de pedal descansado. Entretanto essa distância estava errada, não sei de onde tirei isso. A verdadeira seria 66km, o que já começava a assustar de enfrentar em jejum.

Acordei às 3h para ir ao banheiro e me dei conta do erro da distância. Também percebi que nesse horário, estava sentindo o corpo ainda cansado e já com fome. De forma que teria de comer antes de ir e precisava descansar mais. Deixei pra lá as pretensões de sair cedo e dormi bem. Acordei achando que passava das 9h, porém era 7h.

Descobri que o hotel onde fiquei em Tacuarembó não servia café da manhã. Saí procurando um lugar que servisse o "desayuno", porém só abrem a partir das 8h da manhã. Passei numa padaria e enchi meu estoque de barrinhas que tinha acabado. Perguntei sobre lugares que serviam café da manhã. O cúmulo das ironias foi que acabei indo comer na Turismar, a agência de turismo que sim, serve lanches também. Ou seja, ontem às 14h eu poderia ter passado lá e comido bem, sofrendo muito menos no resto do caminho. Acho que aprendi a lição.

Pedi dois pedaços bem servidos de torta salgada e uma jarrinha de chá. Voltei ao balcão e pedi mais dois e mais uma jarrinha, ao que a moça olhou incrédula e perguntou se era para servir na mesa. Dentre a demora no atendimento, demora para pagar, e o tempo de comer, fui sair lá pelas 9h. A pobre atendente sozinha vendia as passagens e servia na cafeteria.

Bem alimentado, o pedal foi muito mais fácil. O vento contra estava lá, porém bem mais suave e não chegava a incomodar, era até agradável. Felizmente a temperatura também estava um pouco menor que o previsto, e o céu nublado na parte da manhã.

Reparei que por aqui todas as bicicletas param no farol vermelho. Eu furei umas duas vezes quando não tinha movimento, como costumo fazer, porém depois fiquei com vergonha e passei a fazer como todos. A educação dod uruguaios no trânsito é impressionante. Sempre com muito cuidado com as bicicletas. Quando estou na rodovia, lá no meio do acostamento, os carros desviam para mais longe mesmo sem precisar. Já teve vezes do caminhão não só desviar, como mudar de pista para a contramão para me ultrapassar, voltando para a pista dele uns metros à frente. Isso porque eu tava lá longe no acostamento. É muito bonito de se ver.

Em torno das 12h30 parei em um restaurante em Durazno, que serviu excelente comida, um litro de limonada e sobremesa. No total fiquei coisa de 1h30 parado para almoço. Não ia cometer o mesmo erro do dia anterior.

Tenho concluído que em uma pedalada de longa distância como essa, uma alimentação adequada é no mínimo 50% dos fatores para o sucesso. Nem a preparação física é tão importante, tendo em vista que o corpo se adapta rapidamente. Foi bem cansativo e tive várias dores nos cinco primeiros dias, depois o cansaço estabilizou e as dores foram diminuindo. Até que em torno de duas semanas do início, no dia seguinte de manhã eu já nem estava mais cansado do dia anterior. Dores foram todas embora.

A tarde por ser um percurso mais longo que a parte da manhã, foi um pouco mais cansativa. Parei em uma cidade chamava Sarandi Grande onde tomei um refresco é um sorvete de "durazno" em um "paradero", que é como eles chamam essas lanchonetes de beira de estrada. Tenho reparado que toda ou quase toda cidade que passei tem alguma rua importante ou bairro chamado Sarandi. Nesse caso era o nome da cidade mesmo.

Esse dia, pela distância, por ter saído tarde e feito almoço longo, foi quando fiquei até mais tarde na estrada. Aqui começa a escurecer depois das 20h nessa época, então estava tranquilo. Depois das 17h o sol começa a ficar mais ameno e o clima mais agradável. Às 18h a vista estava bonita, e comecei a me dar conta que aquele era praticamente o final da viagem. Amanhã será um percurso mais curto, em áreas mais povoadas. Comecei a filosofar sobre bicicleta, a viagem, a vida, e quem sou e quero ser. Me emocionei muito, inclusive muita coisa deixarei para escrever em um outro momento para tentar traduzir melhor aquele sentimento. De alegria pela viagem maravilhosa e pelos desafios que enfrentei, e de tristeza por estar acabando. De certeza que o Daniel que começou a viagem ficou lá atrás e o Daniel que a termina é outra pessoa, um pouco melhor. Chorei fundo e sentido. Fiquei agradecido de estar de óculos e bandana para não ter de me preocupar se as pessoas nos carros passando estavam vendo.

Conforme eu me aproximava de Florida, o sol se aproximava do horizonte e minha viagem de seu fim.


Este site é basicamente um lugar para descarregar meus pensamentos sobre os mais variados assuntos que me interessarem. No momento se trata de viagens de bicicleta sem marcha e fixa. Você pode falar comigo escrevendo para contato_autor@bus142.net